A Cultura de Massas em Tropa de Elite 2




Como em toda produção em massa, critérios de padronização são sempre necessários. Os produtos precisam trazer algo já familiarizado para que haja uma identificação com seus consumidores. Mas, mais que necessário, é exigido pelo mercado um grau de inovação nas produções. A dinâmica dessa dialética produtiva é dada de acordo com uma série de demandas de sua própria área e seus consumidores. No âmbito das mercadorias culturais essa dinâmica é acelerada, visto que esse tipo de produto é consumido rapidamente.
Depois do sucesso cinematográfico de Tropa de Elite, inclusive internacionalmente, surgiu uma grande expectativa por parte do público e promessas de inovação sobre Tropa de Elite 2: O Inimigo Agora é Outro.  Essa dialética da produção em massa funciona, também e principalmente, nas relações de produção cinematográfica. Então, quais foram os artifícios utilizados nesse filme para alcançar uma síntese que co-responda às exigências de um mercado dinâmico e uma massa tão grande?
Principalmente sendo a continuação de um primeiro filme, Tropa de Elite 2 carrega o desafio de apresentar algo novo, e melhor, ao mesmo tempo que mantém relação com os padrões já estabelecidos pelo primeiro filme. Obviamente, essa situação é mais restritiva em filmes de continuação, mas está longe de ser exclusividade destes. Em toda indústria de bens culturais é procurada essa co-existência no momento da produção: a busca pelos padrões já estabelecidos e a base de um sucesso já conquistado, em equilíbrio com a inovação exigida e esperada pelo mercado. O risco de se tender para um desses extremos está sempre presente. No caso da produção Tropa de Elite 2, esse risco, por um lado poderia levar o filme a ser uma mera imitação, apostando não em um novo sucesso, mas no sucesso já conquistado. E por outro lado, o medo de se produzir uma “sombra” de algo já feito poderia levar o filme a outro extremo de inovação, onde ocorre o distanciamento de um padrão já conhecido pelo público, no caso, os estabelecidos em Tropa de Elite.
Tropa de Elite 2 se propôs, desde seu início, a ser uma continuação assumida não só do primeiro filme, mas de sua história, ou seja, narrando a vida das mesmas personagens. A reutilização destas no novo filme contribui, obviamente, para o resgate dos padrões anteriormente assumidos na história, mas, para acrescentar a lógica individualista necessária ao filme, as personagens foram colocadas em locais e tempos diferentes na trama. Mesmo a necessidade de personagens para papéis maiores no segundo filme, foi suprida com personagens de menores papéis de Tropa de Elite. O fato do filme se passar dez anos depois do primeiro, já propõe que os personagens não possuem a mesma estrutura do filme anterior. Isso possibilita a criação de novas características pessoais das personagens, justificadas pelo tempo decorrido. Ao mesmo tempo, que o público se depara com algo familiar, também vê algo completamente novo.
Ainda, em Tropa de Elite 2, as personagens assumem novos posicionamentos dentro da trama. Dito pelo próprio diretor, José Padilha, um dos aspectos centrais do filme é o reposicionamento do protagonista, Capitão Nascimento (Wagner Moura), que é levado a um cenário desconhecido por ele, e, logo, desconhecido pelo público. “Você vai ver o Capitão Nascimento entrando numa zona totalmente desconfortável para ele, uma situação que ele não sabe exatamente o que está acontecendo, e você vai ver, então, os valores dele serem questionados pelo resultado do que ele faz.” disse Padilha em entrevista. No primeiro filme, Mathias (André Ramiro), possui o arco dramático da trama, enquanto o protagonista se mantém constante, situação que é invertida em Tropa de Elite 2, onde o arco dramático passa para a personagem do Capitão Nascimento. Ainda se tratando de inovação, o tema central do filme também é ampliado, e põe em discussão assuntos que, mesmo envolvendo os abordados no filme anterior, são maiores e mais complexos.
Outro aspecto inerente da produção em massa é a busca pelo máximo consumo, tendendo ao público universal. Nessa procura criou-se o ideal de homem médio, um denominador comum no meio da grande heterogeneidade presente no público. A facilidade de se atribuir gostos e opiniões a esse, chamado homem médio, cria outro fenômeno, a tendência a homogeneizar e a buscar um denominador comum de conteúdos. Assim vemos que em filmes de um determinado gênero (ação, por exemplo), são introduzidos outros gêneros (romance). Através dessa mistura, as diferenças entre jovens e velhos, mulheres e homens, classes alta e baixa, etc. são atenuadas.
Tropa de Elite é um filme violento, com aspectos tipicamente masculinizados, e ainda sim se tornou sucesso em todos os segmentos sociais, de idade ou gênero. O que nos leva à análise de certas características dos dois filmes. No primeiro, Capitão Nascimento é apresentado como o mocinho, um clichê da dramaturgia, que, com seu batalhão, combate traficantes, os vilões. Porém, os atos do protagonista no filme são tão, ou mais violentos e abusivos que dos próprios traficantes. Como garantir que essa personagem, apesar de seus atos, seja a representação do bem e da justiça no filme?
A começar, ambos os filmes são narrados em off pelo próprio protagonista, o que leva a uma adesão do espectador a suas idéias e sentimentos. Outro privilégio do protagonista, é que além de seu trabalho, sua vida pessoal é mostrada. No meio de uma trama extremamente masculinizada, surgem conflitos internos da personagem: sair do BOPE para ficar com sua família, cuidar de seu filho e salvar seu casamento em crise. A presença de conflitos feminilizados, como esses, abrange parcelas do público que, apesar de não gostarem da violência, se interessam pelos conflitos internos da personagem, e acabam culpando os vilões por também esses conflitos. Motivados pela guerra travada, ou pelos conflitos pessoais, o público tende a culpar o “sistema”, antagonista do Capitão. Em Tropa de Elite 2, a ilusão de que esses conflitos haviam se resolvido no final do primeiro filme é desfeita. A luta do protagonista contra o “sistema” toma novas proporções e o conflito passa a ser proteger sua família e manter sua relação com seu filho depois do divórcio. Esse é o sincretismo a que tendem as produções em massa:

O cinema , por sua vez, conseguiu ultrapassar a alternativa que caracteriza a época do mundo, entre filmes com características femininas, ternas, lacrimosas, dolorosas, e filmes com características viris, violentas, agressivas: ele produz filmes sincretizados, nos quais o conteúdo sentimental se mistura com o conteúdo violento. Há portanto uma mixage de conteúdos de interesses femininos e masculinos. (MORIN, 1997:39,40)

Todo esse carisma do protagonista de Tropa de Elite está presente também no carisma do próprio ator Wagner Moura, o que caracteriza outro aspecto da produção de bens culturais: o uso de vedetes. Voltando ao dilema padronização/inovação, as vedetes são um artifício muito utilizado na indústria cinematográfica por se tratarem de superindividualidades.

A presença de uma vedete superindividualiza o filme [...] As vedetes são personagens estruturadas (padronizadas) e, individualizadas ao mesmo tempo, e, assim, seu hieratismo resolve, da melhor maneira, a contradição fundamental. (MORIN,1997:32)

Tropa de Elite 2: Agora o Inimigo é Outro já possui um grande público advindo do primeiro filme, porém Tropa de Elite pode ter contado muito com a participação de um ator já reconhecido nacionalmente para conquistar espectadores. Segundo Morin, normalmente a relação entre a vedete e o autor funciona como uma “dialética repulsiva”. A individualidade de um diminui a do outro. Apesar dessa ser uma situação muito ocorrente, a realidade de Tropa de Elite 2 pode ser uma das exceções.  O diretor José Padilha já conquistou reconhecimento nacional e alguma fama por filmes anteriores como Ônibus 174, e o primeiro filme de Tropa de Elite. Prova de que no caso de Tropa de Elite 2 tanto o talento de quem atua como quem produz é levado em conta pelo público, Wagner Moura, é também um dos coprodutores do filme.
Se por um lado é verdade que a produção cultural cria, em certa medida, o público de massa através de todos seus artifícios, é verdade também que não possui plena autonomia sobre ele. Ao contrário, e diferente das outras culturas, a cultura de massa não possui um caráter normativo, e depende diretamente do comércio e da indústria. Ela propõe modelos e padrões, mas não tem poder para impô-los, esses são estabelecidos através do diálogo entre a produção e o consumo. Esse diálogo estabelecido é desigual, sendo que a produção se expressa através da linguagem, enquanto o consumo limita-se a aceitar ou não o que lhe é proposto. Apesar da desigualdade, os temas e abordagens que surgem se estabelecem ou fracassam dependendo diretamente dessa nova dialética estabelecida. Nessa medida, as preferências e reações da massa influenciam e exigem da própria produção. Mais de 5 milhões de expectadores em duas semanas de exibição e a posição de filme mais assistido desde a retomada em 1991, é um resposta desse fenômeno de oferta e procura que chamamos de público ao que Tropa de Elite e Tropa de Elite 2 põe em discussão, tematizam e a forma como abordam.
A cultura de massa é uma dialética entre produção-consumo, conceitos bastante complexos, mais abstratos que concretos, que estabelecem um dialogo dinâmico entre si sobre a própria sociedade que fazem parte.


MORIN, Edgar. Cultura de massas no século XX: o espírito do tempo. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1997.

A Viagem do Capitão Tornado (Ettore Scola, 1990)




E novamente, Ettore Scola! A Viagem do Capitão Tornado ( Il Viaggio di Capitan Fracassa, 1990) é um filme sobre teatro e amor, com uma história leve e cenas engraçadas. O que primeiramente me chamou atenção ao assistir esse filme foi o cenário e como o diretor fez um uso extraordinário dele. Em outros de seus filmes, pode-se notar como Ettore Scola gosta de trabalhar com o re-enquadramento de cenas dentro de um mesmo plano, e consegue fazê-lo muito bem! Mas, neste filme, o diretor não se contenta em re-enquadrar e muda totalmente de cena dentro do mesmo plano, ou seja, sem nenhum corte! Somente com a movimentação da câmera, cenário, personagens, tempo cronológico e até o clima, tudo muda. Sem dúvida, a melhor passagem para flashback que eu já vi. Ettore Scola já fazia em 1990 o que muitos cineastas não conseguem fazer nos dias de hoje com o triplo de recursos. Aspectos técnicos de lado, A Viagem do Capitão Tornado tem uma história bem legal e um final não tão previsível como tantos filmes.


Sinopse
França, 1774. O último e faminto herdeiro da família Sigognac, deixa o castelo de seus ancestrais para acompanhar um grupo de atores itinerantes, a caminho da corte do rei. Seduzido pela bela Serafina e pelo amor de Isabelle, o jovem Sigognac dará início as suas aventuras. No decorrer da difícil viagem, é Isabelle que, com sua ingenuidade, lhe conquista o coração e por ela Sigognac enfrentará seus maiores desafios. Emboscadas, sequestros, duelos e amores o transformam em um verdadeiro Senhor: o Barão de Sigognac. A Pedido da amada, Sigognac vence sua timidez e se inicia no teatro. Isabelle foge preferindo a vida de conforto e riqueza no palácio do Duque. Desiludido, o jovem Barão descobre no teatro sua verdadeira paixão.

Um Dia Muito Especial (Ettore Scola, 1977)

“Você faz comunicação social? Sério? Me indica um filme!”
Não sei se acontece com todos os comunicólogos por aí, mas eu já escutei isso pelo menos três vezes esse ano. Verdade é que, realmente, esse ano já assisti vários filmes que talvez não assistiria antes de iniciar o curso. Então, vou postar alguns dos que eu assisti e gostei, ou algum que fui obrigada a ver e odiei.




O primeiro da lista será Um Dia Muito Especial (Una Giornata Particolare, 1977). Esse é um filme de Ettore Scola, um diretor italiano exepcional. Não vi todos os seus filmes, mas aposto que qualquer um deles valhe a pena. Pra começar, o filme é com Sophia Loren e Marcello Mastroianni, o casal de atores mais famoso do cinema italiano. A história se passa em 1938, quando Hitler vai à Italia. O filme aborda questões sobre o fascismo de uma forma muito sensível. Ao contrário de filmes com um enfoque extremamente político, Um Dia Muito Especial conta a história de duas pessoas quaisquer e como o regime afetou suas vidas. Algumas situações são bem engraçadas, e não tem como não se apaixonar pelo Gabriele, personagem super cativante interpretado pelo Marcelo Mastroianni.

Sinopse
Roma, 6 de maio de 1938. Benito Mussolini e Adolf Hitler se encontraram para selar a união política que, no ano seguinte, levaria o mundo à 2ª Guerra Mundial. Praticamente toda a população vai ver este acontecimento, inclusive o marido fascista de Antonietta (Sophia Loren), uma solitária dona de casa que conhece acidentalmente Gabriele (Marcello Mastroianni), seu vizinho, quando seu pássaro de estimação foge e ela o encontra pousado na janela do vizinho. Antonietta nunca falara com Gabrielle, que tinha sido demitido recentemente da rádio onde trabalhava por ser homossexual. Ela, por sua vez, era uma esposa infeliz e insegura pelo fato de não ter uma formação profissional. Gradativamente os dois desenvolvem um tipo muito especial de amizade.

Interacionismo Simbólico

      De acordo com o interacionismo simbólico, os seres humanos agem em relação ao mundo segundo significados que este próprio mundo lhe oferece. Esses significados surgem a partir da interação social com os demais indivíduos e são manipulados por um processo interpretativo da pessoa que se relacione com eles. Resumidamente, essas são as três premissas nas quais o interacionismo simbólico se baseia.
Outros estudos tendem a analisar tipos de comportamento como algo resultante de fatores desencadeadores, tanto de ordem psicológica como sociológica. Estabelece-se uma relação direta entre fatores e comportamentos, onde o significado dos elementos em relação aos quais o homem age são desconsiderados ou reduzidos a vínculos neutros entre eles. Para o interacionismo simbólico, os significados são parte fundamental para a formação do comportamento, e logo, para sua análise.
Quanto à origem dos significados, também há divergências. Pode-se entender o significado como algo intrínseco e natural ao elemento, que emana dele e não passa por um processo de formação. Outra forma é entender o significado como uma expressão dos fatores psicológicos concedidos ao elemento pelo indivíduo para quem esse elemento possui significado. O interacionismo simbólico defende que o significado é formado através do processo de interação humana, ou seja, são produtos sociais. “Para um indivíduo, o significado de um elemento nasce da maneira como outras pessoas agem em relação a si no tocante ao elemento.” (BLUMER, p.121)
Por último, o interacionismo simbólico vê o uso do significado, não apenas como a reprodução ou aplicação de significados já existentes, mas acredita que esse uso é feito a partir de um processo de interpretação. Esse processo consiste em duas etapas: a primeira o indivíduo especifica para si mesmo quais os elementos que possuem significado para ele, estabelece-se um comunicação ou interação do indivíduo com ele mesmo. Na segunda, o indivíduo transforma significados de acordo com a situação em que se encontra e a direção de seus atos. Desse modo, a interpretação é um processo formativo, onde significados são utilizados para orientar e formar ações.
O interacionismo preocupa-se com o empenho dos seres humanos em agir enquanto indivíduos, interagindo entre si nas diversas situações, que acaba por constituir a sociedade humana. Essa interação é responsável pela formação do comportamento. Ao interagir entre si, os homens estabelecem uma relação de expectativa em relação à ação do outro pelo fato de conseguirem se colocar no lugar dele. Essa relação faz com que ambos adaptem suas linhas de ação um em relação ao outro, possibilitando uma partilha de valores.
George Herbert Mead identifica duas formas de interação social na sociedade: a “conversação dos gestos” (interação não-simbólica) e o “uso de símbolos significantes” (interação simbólica). A interação não simbólica diz respeito ao processo associativo, onde o homem reage irrefletidamente à ação do outro. Já a interação simbólica refere-se à apresentação de gestos, a interpretação e reação a eles. Nesse tipo de interação o gesto possui significado tanto para quem o realiza quanto pra quem reage a ele. Segundo Mead, o gesto possui uma natureza triádica: indica qual deve ser a reação da pessoa a quem está sendo destinado, a intenção de quem realizou o gesto e significa a ação como um todo, articulando os atos de ambos. “A coexistência grupal humana representa um complexo processo de definição recíproca sobre como proceder e de interpretação das mesmas; através desse sistema os seres humanos vêm a adaptar suas atividades uns aos outros e formar sua própria conduta pessoal.” (BLUMER, p.127)
Um mesmo objeto, seja físico, social ou abstrato, pode possuir diferentes significados para pessoas diferentes, devido a esses significados serem gerados para uma pessoa a partir de como as pessoas com quem ela interage definem o objeto. Assim, cada indivíduo possui um universo de seus objetos com os quais se relaciona e orienta suas ações. Tais objetos são criações sociais formadas a partir do processo de definição e interpretação estabelecido na interação social, e através desse processo com que são criados são passíveis de transformações, reiterações ou descarte.
A interação simbólica é possível a partir do momento que o indivíduo torna-se um objeto para si mesmo a partir das definições que as outras pessoas lhe dão para ele mesmo. Isso que o possibilita analisar-se a partir de um suposto ponto de vista dos outros e interagir consigo próprio. Assim, o homem não se caracteriza como mero organismo respondente, mas um organismo agente que norteia suas ações de acordo com um processo de auto-indicação dos objetos, onde lhes atribui significados e guia seus atos.
Para a coexistência, os indivíduos adaptam uns às linhas de ação dos outros, originando um ação conjunta, composta por diferentes atos, mas diferente e independe deles. A ação conjunta sempre passa por um processo de formação, mesmo que aconteça de forma repetitiva e constante, ela sempre passa por um processo de reelaboração. Dessa forma, não pode ser considerada uma ação pré-estabelecida, já que os significados que a sustentam estão sempre sujeitos à confirmação ou questionamentos, e a ação como um todo estará sempre sujeita a enfrentar situações problemáticas onde deverá se ajustar ou transformar.
Também as instituições, longe de imporem comportamentos de acordo com um sistema autônomo, são constituídas por diversas linhas de ação encadeadas gerando um resultado de acordo com a situação em que foram levados a agir. Por último, todo comportamento de ação conjunta surge a partir de uma base de experiências anteriores que norteiam a ação atual. No novo ato conjunto, como em qualquer linha de ação pretendida por um indivíduo, os participantes trazem consigo significados, objetos e interpretações anteriores.

BLUMER, H. A natureza do interacionismo simbólico. In: MORTENSEN, Charles (Org.) Teoria da Comunicação: textos básicos. SP: Mosaico, 1980

Estudo das Mediações

Neste texto, Barbero propõe uma modificação do entendimento da comunicação numa tentativa de sair de pontos de vista extremos, embasando-se em estudos feitos sobre a comunicação no América Latina. Como já antecipado pelo título, o autor tenta modificar o posicionamento pelo qual se tenta entender a comunicação, saindo de um estudo com base nos meios, a um embasado nas mediações, lugares onde os sentidos são produzidos.
Inicialmente, começa por discutir os dois pólos com que são normalmente entendidos os processos sociais. Um dos pólos, caracterizado pelo autor como um progressismo iluminista, vê nas práticas culturais e na natureza do povo reações às induções da classe dominante e um obstáculo ao desenvolvimento, enquanto o outro, caracterizado como nacionalista populista, que tenta um resgate das raízes. Esse último busca no índio uma essência cultural pura e definidor da identidade original, contaminado pela modernização e mestiçagem. Essa pureza buscada em um índio tido como fato natural do continente é a - histórico.
É apresentada uma diferenciação analítica da modificação que a produção indígena e seu sentido sofreram. Primeiro as modificações sofridas em razão de pressões vindas do ritmo de consumo capitalista, que acabam por transformar as produções artesanais e festas em fonte de renda para os indígenas e espetáculos para turistas. As mediações promovem mudanças no sentido do trabalho dentro da própria comunidade, desconectando suas atividades tradicionais do sentido em que originalmente foram estabelecidas.
Ao se tratar do popular, há uma tendência a se remeter ao rural, algo simples e elementar, que não seria capaz de alcançar a complexidade e artificialismo da criação cultural. Idéia refutada pelo autor que analisa a evolução do popular partindo do indígena, ao rural, ao popular e ao massivo. Para fins de exemplificação e esclarecimento, utiliza-se de um mapa de transformações sofridas pelo popular urbano no México que pode ser dividida em três etapas. A primeira, caracterizada por movimentos referentes ao tom revolucionário da época, torna socialmente aceitáveis gestos e costumes até então reprimidos, junta elementos tanto do rural como da cidade nas produções musicais e instaura novos espaços e dimensão popular. A segunda é caracterizada pela hegemonia da indústria cultural, êxodo rural e industrialização. O populismo trás um tom nacionalista, gerando uma simbolização mitificada da identidade nacional, reiterando os códigos dos costumes e massificando os comportamentos. O rádio e o cinema fazem papel de mediador entre o tradicional e o moderno. Por último, o nacionalismo é abandonado por uma visão transnacional, com tendência à homogeneização dos estilos de vida desejáveis, incentivo ao consumo e mitificação do progresso.
A partir da proposta de deslocamento do interesse para as mediações, Barbero inicia sua análise sobre os movimentos sociais provenientes do bairro. No bairro são iniciadas novas redes, formando culturas específicas dos setores populares, normalmente caráter mais reformista. Um importante configurador dessa cultura são os mediadores, que “operam nas instituições locais fazendo conexão entre as experiências dos setores populares e outras experiências do mundo intelectual” (Barbero, 2001, p.282) O bairro é concebido como local de referência e constituição de identidade e mediador entre o universo privado da casa e o público da cidade. É nele onde são estabelecidas relações sociais mais amplas que a familiar e mais densas que as formais impostas pela sociedade.
Barbero denuncia que várias características culturais da América Latina foram suprimidas a fim de se enquadrarem em teorias pré-formuladas. De acordo com o ideologismo, os meios massivos foram reduzidos a meros instrumentos e o dominador priorizado nas análises. A análise dos dominados e os possíveis conflitos foram subestimados a simples reflexos do poder dos meios, onde as necessidades e submissão dos consumidores poderiam ser determinadas por uma análise dos objetivos econômicos e ideológicos. Ao modelo semiótico faltou uma abrangência que conseguisse delimitar o campo, sendo que este se limitou à análise de mensagens e códigos.
Com o modelo informacional, as análises se fecharam mais nos métodos produzidos devido ao tom positivista do modelo, limitando as problematizações. Questões fundamentais como a do sentido e do poder, condições sociais de produção do sentido foram ignoradas, eliminando a análise das lutas pela hegemonia. Esses modelos ainda pressupõem uma linearidade do processo comunicativo e uma equivalência das posições de emissor e receptor, simplificação que não sustenta os muitos conflitos presentes no processo e limita o acesso a questões mais abrangentes que o modelo permite problematizar.
Para Barbero, essa concepção instrumental da comunicação transforma problemas sociais e em problemas técnicos, levando a uma máxima de o debate público ser prescindido por uma verdade científica ou solução técnica, gerando a dissolução da realidade política. Além das limitações dos modelos que trouxeram a mudança de paradigma, mas também processos sociais na América Latina que modificam e transformam o objeto estudado. Uma dessas mudanças foi o novo movimento de transnacionalidade, que tem na comunicação um de seus palcos principais. A inevitável homogeneização trazida pelo processo choca-se com a identidade e pluralidade nacional que constituem o país.
O que é proposto é uma tentativa de entender a comunicação a partir da cultura, das tantas discursividades em conflito que travam lutas pela hegemonia. Deixar de pensar o processo comunicativo a partir das disciplinas e dos meios. Os movimentos sociais sempre se encontram em embate com a institucionalidade a fim de configurar o plano simbólico nas matrizes culturais. A partir desse lugar de análise, a comunicação se mostra um processo produtor de significações e não somente uma circulação de informações, e o receptor adquire um novo e mais importante papel, passando de decodificador a também produtor.
O consumo, um dos maiores exemplos da resposta à força dos meios, é apontado também como produtor de sentidos. “Lugar de luta que não se restringe à posse dos objetos, pois passa ainda mais decisivamente pelos usos que lhes dão forma social e nos quais se inscrevem demandas e dispositivos de ação provenientes de diversas competências culturais.” (Barbero, 2001, p.302) Ao entendermos a leitura como atividade na qual os significados são organizados em um sentido, o leitor passa ater uma capacidade produtiva que desafia e idéia da verdade contida na mensagem, e apenas decodificada, promovendo uma negociação dos sentidos a partir do texto.
Como propõe como ponto de partida as mediações, são apresentados três lugares de mediação: a cotidianidade familiar, a temporalidade social e a competência cultural. O cotidiano familiar, que é o local primeiro de reconhecimento dos indivíduos, estabelece tipos de ralações próprias, alterando a forma de leitura nesse local. Devido às relações estreitas de proximidade existentes nesse espaço, a televisão simula o contato e a retórica do direto para se adequar à mediação da cotidianidade familiar. A simulação do contado utiliza de mecanismos como interlocutores que interpelam seus espectadores, enquanto a retórica do direto trás uma sensação de proximidade e imediatez, característicos do cotidiano. A temporalidade social diz respeito a locais de mediação mais abrangentes que o familiar. O cruzamento de gêneros e tempos configura uma sequência ou programação na televisão que atende a demandas imposta pelos horários e tipos de espectadores. A série e os gêneros fazem mediação entre o tempo do capital e o tempo da cotidianidade.
Ao discutir a competência cultural, o autor fala como na televisão o massivo se faz tão explícito, e os gêneros aparecem como unidades básicas, que são responsáveis pela mediação entre as lógicas de produção e as lógicas de reprodução, entre formatos e usos, que perpassam a comunicação, cultura e política.As lógicas das condições em que ocorre perpassam a própria produção, e deixam vestígios tanto no que é produzido quanto em como se dá o processo. Assim, o desenvolvimento tecnológico, os níveis e fases de decisão, as ideologias profissionais, as rotinas de produção e as estratégias de comercialização se apresentam como dispositivos de grande importância, inicialmente na produção, mas em todo processo comunicativo. Do mesmo modo se pode analisar as lógicas dos usos segundo hábitos de classe de acordo com a utilização no tempo e no espaço cotidianos, e que significados sociais cada segmento proporciona. A mediação entre essas duas lógicas, de produção e dos usos, é feita pelos gêneros. De acordo com as mediações, na televisão, um gênero se define por sua estrutura interna, seu lugar na programação e reconhecimento cultural dos grupos.
Voltando à dicotomia inicial – pureza original versus dominação social – Barbero afirma que só a partir dessas duas posições se pode continuar pensando o massivo como algo exterior ao popular. Para o autor, pensar o popular a partir do massivo confira um novo funcionamento da hegemonia. Desse modo, os sentidos intitucionalizados ou as lutas ocorrentes no mercado simbólico não são atribuídas somente à lógica dos interesses da classe dominante, mas também com a dos dominados. Por fim, o autor apresenta pesquisas feitas na América Latina que dão base a essas últimas afirmações. Começa por falar das feiras urbanas no México, que se transformaram em frentes culturais, onde há o encontro de classes sociais que, a partir de seus interesses, lutam para atribuir sentido ao próprio evento cultural. Outro exemplo é o das emissoras local, popular urbana e andina-provinciana, que guardadas suas especificidades, todas “trazem dimensões da vida cultural do país desconhecidas ou negadas nas emissoras de corte nacional”. Essa quebra da homogeneização e aparecimento da pluralidade cultural só é possível no campo televisivo no espaço reservado à comicidade, onde se é permitido a ridicularização das classes altas.

MARTIN-BARBERO, J. Capítulo 2 - Os métodos: dos meios às mediações. In: Dos meios às mediações  Comunicação, cultura e hegemonia. Rio de Janeiro: Ed. UFRJ, 2001

Modelo Semiótico

      O processo comunicativo é aqui entendido como a articulação de momentos diferentes, interligados entre si, porém com características e condições de existência particulares. Esses momentos são a produção, a circulação, a distribuição/consumo e a reprodução. Ao passar por esses momentos, a mensagem também toma diferentes formas, podendo sofrer distorções ao longo do processo.
A produção de um discurso necessita tanto dos meios materiais para tal, como das relações sociais de produção, que têm influencia sobre como o discurso será codificado. Uma vez posto em circulação, o discurso tido como significativo, será decodificado pela audiência a fim de ser transformado em prática social para que haja efeito. Os significados decodificados que são responsáveis pelo efeito, não necessariamente o que foi codificado na produção.
Um momento chamado “forma-mensagem” é onde um determinado evento ou discurso será moldado e re-estruturado para se adequar às novas regras formais do discurso. Vemos isso na forma como um telejornal re-conta certo evento, moldando-o para adequar-lo dentro dos padrões discursivos do próprio veículo. O discurso, apesar de sujeito a distorções no processo, é o mesmo, porém em uma forma diferente desse momento específico.
O processo entre a codificação e a decodificação é caracterizado como assimétrico, justamente por sofrer distorções ao entrar e sair da forma discursiva. Certos signos, principalmente os icônicos, pela sua aparente representação fiel do real são considerados como dados naturalmente e não construídos socialmente. Por mais que a universalidade destes signos aparente sua naturalidade ou autonomia, o signo não é o real em si e precisou ser codificado e depois traduzido através da linguagem para que houvesse a prática discursiva. A linguagem é sempre um código de representação do real, mas não trás o real em si. Assim, essa sensação de naturalidade diante de tais signos mostra como a utilização do código é universalizada e, nessa situação, há grande simetria entre a codificação e a decodificação.
Outro aspecto abordado é o nível conotativo do signo, não somente seu significado literal, mas sua referência em relação ao contexto, associação com diferentes sentido e seu posicionamento dentro de cada discurso. “O nível de conotação do signo visual [...] é onde os signos já codificados se interseccionam com os códigos semânticos profundos de uma cultura e, assim, assumem dimensões ideológicas adicionais e mais ativas.” (HALL, p.395). Esse nível conotativo tem uma grande relação com a cultura, os significados e usos desse signo estabelecidos socialmente. Assim, remetendo o signo ao “mapa de sentido” existente em determinada cultura, o significado pode ser ampliado para além de sua idéia literal através do nível conotativo. Esse mapa de sentido é “lido” de acordo com “sentidos dominantes”, que estabelecem um padrão de leitura preferencial. Sentidos esses dominantes, não determinados, pois são passíveis de mudança, mas asseguram uma decodificação dentro de certos limites no nível conotativo.
Apesar da não-similaridade existente no processo discursivo, e a impossibilidade da codificação garantir que o discurso seja equivalente em todo o processo, a codificação produz limites à decodificação.
Três formas hipotéticas de como um discurso televisivo pode ser decodificado são caracterizados por Hall. A primeira é a posição begemônica-dominante. Essa posição ocorre quando o telespectador opera dentro do código dominante, ou seja, quando ele se apropria do sentido conotado se forma direta e completa, decodifica a mensagem nos termos em que foi codificada, gerando em comunicação o mais transparente possível. O telespectador pode operar dentro do código negociado, onde, apesar de receber a maioria das mensagens segundo a maneira dominante, mas não exclui elementos de oposição e adaptação. A não hegemonia do código dominante permite essa negociação de sentidos através de lógicas específicas de acordo com a posição de cada um em relação com o próprio discurso e as relações de poder. Ainda é possível ao telespectador operar em um código de oposição, onde a decodificação é feita de maneira globalmente contrária. Nesse caso, mesmo entendendo o sentido conotativo e literal da mensagem codificada, é utilizado um referencial alternativo para a decodificação, diferente do código dominante.

HALL, S. Codificação/Decodificação. In: Da diáspora. BH: ED. da UFMG, 2003

Cultura de Massas

   Para Morin, no decorrer do século XX, há uma segunda industrialização que também gera conseqüências nos domínios internos do homem, gerando as mercadorias culturais. Essa cultura massa é produzida em uma base industrial, tratada como mercadoria e produzida para ser consumida por uma massa social. Essa Terceira cultura se estabelece ao lado das culturas nacionais e as culturas clássicas (humanistas e religiosas).
Morin faz uma crítica aos intelectuais que, com base nas idéias de Marx, consideram a cultura de massa uma forma de alienação do povo no sistema capitalista, e um tipo de cultura inferior. O produto cultura não se estrutura com base na Arte, considerada a verdadeira cultura libertadora pelos cultos, pois por um lado é determinada por sua forma de produção industrializada, e por outro por seu caráter de consumo rápido. Além de que, a chamada cultura superior, já é produzida de uma forma padronizada para ser considerada como tal.
Outra crítica aos outros estudiosos da comunicação, chamados cultos, é do modo como se afastam do objeto para estudá-lo, no caso da comunicação de massa, analisando-a como algo inferior e não mantendo um contato direto com ela, gerando conclusões muitas vezes equivocadas sobre o processo por, justamente, não participarem dele. A análise de um objeto deve ser feita juntamente com uma auto-análise, para que os resultados não sejam influenciados pela sua visão específica dele. Para essa analise, “é preciso conhecer esse mundo sem se sentir um estranho nele”. “Enfim, o método da totalidade deve ao mesmo tempo evitar o empirismo parcelado, que, isolando em campo da realidade, acaba por isolá-lo do real, e as grandes idéias abstratas que, como as vistas televisionadas de um satélite artificial, só mostram um amontoado de nuvens acima dos continentes.” (MORIN, p 21)
Apesar do impulso que a comunicação de massa sofreu devido à própria dinâmica do sistema capitalista, a cultura de massa se mostrou presente independente dele, como exemplo, o Estado Soviético. A dinâmica da cultura de massa nesses dois regimes se deu, logicamente, de forma diferente. No capitalismo essa produção se deu regulada pelo mercado, a fim de gerar lucro, onde os meios procuram de adequar ao consumidor, enquanto no socialismo o regulador era o Estado, a fim de propagar material político-ideológico, procurando que o consumidor se adequasse ao Estado. Independente do objetivo de gerar lucro ou propagar uma ideologia, tanto pela iniciativa privada quanto pelo Estado, há sempre a meta de se atingir o maior número de indivíduos possível.
No processo produtivo das mercadorias culturais há um choque de interesses, ou uma relação de forças entre a padronização exigida pela industrialização, e a individualização exigida pelo mercado consumidor. O rápido consumo das mercadorias culturais produz uma grande demanda por objetos novos, porém esses objetos precisam mantém um padrão já conhecido pelo público para que seja bem aceito. Essa dicotomia irá orientar todo o processo de produção e criação. A busca pela síntese entre a lógica industrial-burocrática-monopolistica-centralizadora-padronizadora e a contralógica individualista-inventiva-concorrencial-autonomista-inovadora é a dinâmica que define a adaptação da indústria cultural ao público e vice-versa.
Na procura busca por atingir o maior público possível, a indústria de massa procura um denominador comum dos indivíduos, fazendo com que sua maioria se identifique com o produto. Nessa busca, não se referem a todos, nem a ninguém, mas ao chamado homem médio, que busca ser o denominador comum no meio de tanta diversidade. Por isso, os produtos tendem ao sincretismo, agrupando diversos gêneros de uma só vez.

MORIN, Edgar. Um Terceiro Problema. Cultura de massas no século XX: o espírito do tempo. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1997.
MORIN, Edgar. A Indústria Cultural. Cultura de massas no século XX: o espírito do tempo. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1997.
MORIN, Edgar. O Grande Público. Cultura de massas no século XX: o espírito do tempo. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1997.

Indústria Cultural

A Escola de Frankfurt se encontra mais próxima das idéias do Paradigma Informacional, porém difere dos estudos da Escola Americana no trajeto de seus estudos. A Teoria da Sociedade de Massa, ou seja, a sociedade como um conjunto heterogêneo e anônimo, de organização frágil, com a dissolução e fragmentação de seus laços, é defendida pela Escola de Frankfurt tanto quanto pelos estudos americanos, porém os caminhos que levaram cada um à conclusão são bem distintos.
Uma distinção é trazida por Adorno entre cultura de massa e indústria cultural. Para ele a cultura de massa pode indicar uma cultura que surge espontaneamente das próprias massas, enquanto a indústria cultural é responsável pelos produtos adaptados ao consumo das massas.
A indústria cultural é responsável pela junção da alta cultura e da baixa cultura, a fim de se chegar a um produto de massificação. “Ela força a união [...] da arte superior e da arte inferior. Com prejuízo para ambos. A arte superior se vê frustrada de sua seriedade pela especulação sobre o efeito; a inferior perde, através de sua domesticação civilizadora, o elemento de natureza resistente e rude, que lhe era inerente enquanto o controle social não era total.” (ADORNO, p.287-288).
Uma das críticas dessa idéia é justamente como se definir o que é baixa e o que é alta cultura, já que esta é uma difícil diferenciação e é bastante dinâmica, sendo que, freqüentemente uma obra ou movimento passa de um conceito para o outro.
Para a indústria cultural, o sujeito não é agente, mas sim seu objeto. As produções culturais já são dadas, desde seu princípio, a fim de serem consumidas e gerarem lucro. Assim, por mais que queira parecer diferentes, todas elas encobrem uma mesma fôrma na qual são feitas, e uma mesma motivação. Em uma releitura das idéias de Marx, esse processo tem como objetivo industrializar a própria cultura, gerando uma retroalimentação do sistema capitalista e alienar o indivíduo mesmo em seu tempo de lazer. O capitalismo se auto-regula, e a indústria cultural é uma das ferramentas para a manutenção de seu status quo. Nesse estudo a idéia de massa é produzida pela luta de classes, no caso, burguesia e proletariado. Assim, nessa concepção, massa é um produto histórico do sistema capitalista.
Para Adorno, a forma de libertação é a arte. Através de sua singularidade e seu espírito crítico, a arte dá autonomia ao sujeito que interage com ela através da crítica e interpretações individuais. Através da padronização dos bens culturais, a padronização do espírito, o sujeito perde o seu potencial crítico e a arte sua capacidade emancipatória.
A padronização ou massificação promovida pela indústria cultural controla os limites da obra, conseqüentemente limitando a capacidade crítica de quem a consome. O embate apresentado por Adorno é entre a arte, que dá autonomia ao sujeito, e a indústria cultural, onde o sentido é dado na produção, manipulando e restringindo a capacidade interpretativa do sujeito.

ADORNO, Theodor. A indústria cultural. In: COHN, Gabriel. (Org.) Comunicação e indústria cultural. 4. ed. SP: Nacional, 1978. p.287-295

Escola Americana

   A Escola Americana teve seus estudos baseados no Paradigma Informacional, que tinha por objeto de estudo os meios de comunicação em si. Com um pensamento Positivista, procurava aproximar seus métodos ao das ciências naturais, o que trouxe uma visão funcionalista aos estudos. Laswell, em uma analogia com a biologia comparou a sociedade a um organismo vivo, que possui várias instituições e uma delas seriam os meios de comunicação. Assim, a pergunta que orientou os estudos das funções dos meios de comunicação era: qual o papel que esses desempenham na sociedade?
As funções, entre muitas, consideradas básicas são a informativa, a de integração, educativa e de entretenimento. Essa visão funcionalista com base no equilíbrio e manutenção do sistema, apesar de aplicável em várias situações, desconsidera as disfunções e conflitos apresentados dentro da sociedade durante toda a história. Lazarfeld e Merton fazem considerações tanto sobre funções quanto disfunções, por exemplo, a disfunção narcotizante.
Nos estudos dos efeitos da comunicação, o enfoque era como os indivíduos são afetados pelos meios de comunicação. A Teoria da Agulha Hipodérmica teve sua base em uma corrente da psicologia que defendia que “os comportamentos são ‘respostas’ a ‘estímulos’ ambientais” (Reale, 1991:876). Assim, o processo comunicativo foi resumido no esquema mecânico de “estímulo-resposta”, onde seria possível “inocular” o pensamento do emissor no receptor se a comunicação se desse de masseira correta. Esse olhar sobre a comunicação estava vinculado à idéia de sociedade de massa, um conjunto heterogêneo, anônimo, de organização frágil, cuja identidade estava nos meios de comunicação, e pré-supunha uma onipotência dos meios assim como uma vulnerabilidade das pessoas e de seus laços sociais.
A lógica simplista desse modelo não consegue dar solução aos complexos problemas da comunicação. Com essa insatisfação, os estudos se voltaram para o que ocorre no processo, entre o emissor e o receptor. As pesquisas sobre o Processo de Persuasão, também formulada na psicologia, é uma tentativa de aprimoramento do mesmo esquema E-R. Nessa teoria são acrescentados ao modelo E-R os fenômenos psicológicos que intervêm no processo comunicativo como variáveis de E e R, e entre eles. A mais importante generalização dessa teoria é que “as mensagens não são estímulos suficientes em si mesmas, mas ganham sua eficácia se e quando bem combinadas com o quadro e as disposições psicológicas da audiência.”(FRANÇA, Vera, 2003:16)
Com variáveis da audiência, da mensagem e comportamentais, a pretensão não era mais chegar a uma fórmula comunicativa que atingisse a todos, mas, com o controle das variáveis, otimizar a mensagem e conseguir atingir a maioria. Apesar do grande avanço que o estudo da persuasão trouxe, as variáveis se mostram intermináveis, tornando situações cada vez mais específicas e dificultando uma generalização do processo comunicativo. Além de muitas das variáveis e interferências não serem exclusivamente psicológicas.
Para o confronto com essa análise estritamente psicológica, outra pesquisa sobre os meios de comunicação iniciou-se dentro da sociologia, com enfoque nos processos de influência. Analisando a audiência, o objetivo era estudar quais as influências que atravessam as relações sociais e moldam o comportamento dos grupos, e os meios de comunicação são uma delas. Segundo esses estudos, os meios de comunicação não atingem diretamente as pessoas, mas a mensagem é filtrada e recebida, ou não, de formas diferentes de acordo com a localização do indivíduo dentro da sociedade. Os grupos sociais são analisados como variáveis ou influências dentro do processo comunicativo.
Uma importante pesquisa realizada nesse estudo dos efeitos foi a sobre líderes de opinião. Lazarsfeld escreve muito sobre esse assunto e sobre o grande poder que a comunicação face a face tem sobre os meios de comunicação em massa. Líderes de opinião são pessoas mais interessadas e informadas sobre determinado assunto cuja opinião é respeitada por um determinado grupo de indivíduos. Foi criado o conceito de fluxo de duas etapas, onde a mensagem seria emitida, teria os líderes de opinião como mediadores, e então chegaria aos receptores. Esse conceito foi superado quando verificou-se que mesmo os líderes de opinião buscam informações e posicionamentos entre si, transformando o esquema comunicativo em uma rede de influências.
O poder da mídia ainda é admitido, mas não como fator único e suficiente para promover mudanças comportamentais, e é mostrado muito mais eficiente na reafirmação de valores e comportamentos já existentes. Lazarsfeld e Merton ainda falam sobre alguns critérios para que os meios de comunicação consigam promover mudanças comportamentais na sociedade: a monopolização (inexistência de contrapropaganda), a canalização de padrões pré-existentes e a suplementação através de contatos sociais (utilização dos líderes de opinião).
Outra teoria incorporada pelos estudos da comunicação foi a Teoria Matemática. Desenvolvida para fins práticos, esse estudo é bem restrito só traz alguns conceitos e um novo ponto de vista sobre a comunicação como auxílio para explorar algumas características diferentes do processo comunicativo. A comunicação é vista como um processo com componentes que se articulam dentro de uma certa organização, cuja sistematização traria um controle sobre o fenômeno. Duas idéias centrais são a de ruído e do equilíbrio do grau de informação. O ruído é tudo que prejudica a transmissão da mensagem e, a princípio, não deveria fazer parte do processo. Importando a idéia para o campo, propriamente dito, da comunicação, o ruído, mais que falhas mecânicas, pode ser considerado uma mensagem em outra língua ou uma palavra desconhecida pelo receptor. Assim, o problema a ser superado para uma transmissão perfeita é o ruído. O equilíbrio do grau de informação trabalha com dos conceitos opostos e extremos: a entropia e a redundância, onde haveria falta de uma mensagem.
A Teoria Matemática não se preocupa com o conteúdo da mensagem, mas como a mensagem, seja ela qual for, chegue ao destinatário da mesma forma que foi emitida, com o mínimo de ruído. Essa visão do processo já foi duramente criticada por ser extremamente rígida, mecânica e não tratar da produção de sentido. Lembrando que essa é uma teoria elaborada para fins práticos, mais fora do campo da comunicação e dentro do campo das exatas, é razoável que ela não tenha a pretensão de explicar todos os aspectos e particularidades do processo comunicativo. Se tratada como o que realmente é: um olhar diferente, dentre tantos outros, sobre o mesmo objeto, mesmo com suas obvias limitações (como todas tem), essa teoria ajuda a mostrar como a comunicação é complexa, se manifesta de diferentes formas, e muito dificilmente, talvez impossível, seja completamente entendida por um único olhar.
Entender a comunicação exclusivamente por um modo de análise chega a ser um retrocesso, uma volta ao Positivismo e uma volta ao início do texto. Por fim, o Paradigma Informacional que fundamentou a Escola Americana, foi achado insuficiente por alguns, e seu objeto muito restrito (os meios de comunicação), o que levou ao desenvolvimento do Paradigma Relacional.


FRANÇA, Vera. Capítulo 2. Curso Básico de Teoria da Comunicação. BH: UFMG, 2004. Mimeografado.